Depois de quase 30 anos da sua chegada ao Brasil, a Permacultura cai nas graças do governo e da mídia. Agora, cada vez mais pessoas levam a novidade para ser implementada no campo e na cidade, e começam a perceber os benefícios de se adotar um estilo de vida com menos desperdício e mais eficiência.
A chegada tímida da Permacultura no Brasil, no início da década de 80, trazida por seus idealizadores australianos, não reflete mais a atual realidade desta prática. Espécie de filosofia de vida que busca a permanência do homem na Terra e combina técnicas milenares a modernos processos de aproveitamento de recursos naturais, a Permacultura está mais estruturada e ganhou adeptos em todo país.
Institutos de Permacultura sediados em biomas - ecossistemas como a Mata Atlântica, Pantanal e Amazônia - estão cada vez mais articulados às Secretarias Públicas - como a do Verde, da Agricultura e do Meio Ambiente - para disseminar novos processos e métodos híbridos, estimulando atividades cotidianas que não comprometam os recursos naturais que pertencem a gerações futuras.
Uma estação de Permacultura pode ser comparada a uma antiga oficina de criação. "São geralmente casas de permacultores que se destacam e, naturalmente, passam a promover técnicas localmente desenvolvidas", define Marcelo Bueno, coordenador do Instituto de Permacultura da Mata Atlântica (IPEMA).
A atual crise dos recursos naturais é prato cheio para os permacultores. Esses novos designers de soluções para a sustentabilidade enxergam boas oportunidades no contexto de crise dos recursos naturais, e redesenham a interação entre os homens e o planeta, para garantir, igualmente, a permanência da espécie e a melhora da qualidade de vida.
Com o objetivo de equilibrar a natureza e obter resultados mais eficientes no longo prazo, antigos métodos são resgatados, como a agricultura biodinâmica, que considera a influência dos astros na definição dos períodos de plantio e colheita. Paralelamente, novos processos como o da Agrofloresta vêm à tona. Neste caso, o plantio para o consumo e comercialização de determinados alimentos é feito no ecossistema de uma floresta virgem. Assim, não há a necessidade de desmatar uma área para cultivá-la, e a própria floresta é fortalecida pelo novo plantio agrícola.
Para Guilherme Ferrão, permacultor especializado em gestão ambiental, a Permacultura vai além do cultivo da terra. "É uma nova forma de pensar", explica, referindo-se ao fato de a Permacultura enxergar que o homem, a sua morada e também o meio ambiente fazem parte de um mesmo e único sistema integrado, podendo ser comparado a um organismo vivo. "Pensar soluções para que a relação entre estas três partes seja harmônica e eficiente é a nossa tarefa", acrescenta.
Guilherme, que passou quatro anos promovendo a Permacultura no meio rural, está à frente de um projeto de ecoturismo no centro urbano de Embu das Artes, próximo à cidade de São Paulo."As práticas da cultura de permanência são aplicáveis igualmente nas áreas urbana e rural.", explica. O projeto, que pretende substituir práticas locais de forma a torná-las menos impactantes ao meio-ambiente, dará maior visibilidade à região que já atrai muitos turistas. Financiado pelo Ministério do Trabalho, a proposta deverá gerar mais empregos e renda na região.
Aprofundar-se no assunto é uma forma de desenvolver habilidades para encarar questões do dia-a-dia, como o que fazer com o lixo produzido dentro de casa ou como agir para diminuir a conta de luz utilizando, por exemplo, a energia solar. Ao mesmo tempo, a prática ajuda a compreender estas mesmas questões de forma sistêmica. Existem problemas ocultos na questão do lixo. Além da repulsa em manusear os próprios resíduos, geralmente os consumidores não se dão conta de que cada item que se joga fora traz consigo uma quantidade de outro lixo que foi gerado em sua fabricação.
"O que vemos hoje, felizmente, é que a população tem interesse em se capacitar tanto para se tornar mais eficiente no consumo pessoal quanto para encontrar formas mais ecológicas de empreender", acrescenta Marcelo, que faz parte do movimento desde o início e, há tempos lota os cursos promovidos pelo IPEMA, principalmente no período das férias, quando moradores das cidades participam.
Com toda a logística cotidiana depende de energia, a principal busca, segundo Marcelo, é pela independência energética e pela conscientização de que a insistência em adotar fontes energéticas não renováveis, tende a elevar o custo de vida a níveis muito altos. "Na minha casa, produzo boa parte da energia que consumimos. Um pouco solar e outra parte hidráulica, pelo sistema de captação de água da chuva.", conta o especialista, que também faz compostagem de todo o lixo orgânico, transformando-o em adubo rico em húmus e nutrientes minerais.
A composteira, estrutura utilizada para o processo de decomposição do lixo orgânico é um bom exemplo de empreendimento criativo que surge da Permacultura. Ainda são feitas artesanalmente e podem ser usadas até mesmo em apartamentos. "O Churume é um ótimo fertilizante natural" diz a paulistana Tatiana Feijó, que há oito meses é adepta da compostagem e usa o húmus e o churume, ambos resultados do processo, nas terras do seu sítio em Joanópolis.
Preservar a diversidade de fontes energéticas e descentralizar a produção, são dois caminhos possíveis através da Permacultura. No Brasil, quase três quartos da energia é gerada por hidrelétricas, que são fontes limpas de energia. O problema é que o sistema é centralizado e as hidrelétricas causam impacto ambiental. "É possível que voltemos ao cenário que existia antes de Furnas e Itaipu. Cada cidade ou região tinha a sua própria pequena hidrelétrica", conclui Marcelo.
Projetos surgem de norte a sul do País, como as recentes bioconstruções, que integram as muitas técnicas já desenvolvidas pela Permacultura. Uma delas é o telhado verde ou vivo, que contempla plantações sobre as telhas, auxiliando o isolamento térmico e o escoamento de águas da chuva. Outra técnica é o ecopavimento, piso permeável eficiente na prevenção de enchentes.
Estes novos modelos de construção estão sendo aplicados em projetos que vão de pousadas na região amazônica à edifícios em grandes centros urbanos, mas atingem seu ápice, nas chamadas Ecovilas, comunidades-modelo, urbanas e rurais, que vêm se estabelecendo ao redor do mundo e servem como um grande banco de dados de soluções e alternativas aos atuais questionamentos sobre a relação entre os homens, o meio-ambiente e o aumento da qualidade de vida.
Os iniciados na prática desenvolvem projetos cada vez mais ousados, mas para boa parte da população o assunto ainda é apenas uma curiosidade. Se tudo parece complicado, os envolvidos garantem que a melhor forma de aprender é aventurando-se na prática. É simples e o resultado é mágico. Como na Lei de Lavoisier, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma.
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